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O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, passou a assumir o protagonismo antes mesmo de o governo começar. Em dezembro, ainda na transição, tomou a frente na reação aos ataques de bolsonaristas ao prédio da PF, em Brasília, e à tentativa de um ataque a bomba no aeroporto da capital. Após o 8 de Janeiro, ele surgiu anunciando um “pacote da democracia”, com medidas para endurecer punições aos golpistas. Ao longo dos últimos seis meses, fez também aparições midiáticas em meio à comoção provocada pelos ataques a colégios, da tentativa regulação das redes sociais — “enquadrou” executivos das plataformas em uma reunião gravada — e da descoberta de um plano de ataque do PCC contra o senador Sergio Moro (União-PR). A superexposição do ex-governador maranhense não afetou sua relação com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas vem causando efeitos colaterais em diversas frentes de desgaste e embates.
O campo de batalha em que Flávio Dino mais tem pelejado publicamente é o Congresso. Somadas CPIs, comissões temáticas e o plenário da Câmara e do Senado, o ministro já foi alvo de 58 pedidos feitos por parlamentares da oposição para ser convocado a prestar esclarecimentos (veja o quadro ao lado). É um recorde que dificilmente será batido no atual governo. Convidado a falar no Congresso em quatro ocasiões, protagonizou audiências em que não foram poucos os tumultos com bolsonaristas. Em uma delas, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, em março, Dino comparou a “terraplanismo” declarações do deputado novato André Fernandes (PL-CE) de que o ministro seria alvo de 277 processos na Justiça — a afirmação foi feita com base na interpretação errada de uma precária pesquisa na internet. No início de maio, na Comissão de Segurança Pública do Senado, Dino fez troça do senador Marcos do Val (Podemos-ES) e sua autoproclamada relação com a SWAT, unidade de elite da polícia dos Estados Unidos. “Se o senhor é da SWAT, eu sou dos Vingadores”, provocou.
Apesar da avaliação de que Dino conseguiu se sair bem nas audiências — o deputado Marco Feliciano (PL-SP) chegou a dizer que ele “engoliu uns dez deputados” nas oitivas —, a oposição promete manter pressão sobre ele. “Vamos continuar convocando, ainda que ele tenha sempre esse comportamento desrespeitoso, de piadinhas e de querer ‘lacrar’ ”, diz o líder da oposição na Câmara, Carlos Jordy (PL-RJ). Dino também está na mira dos bolsonaristas da CPMI do 8 de Janeiro, com pedidos de convocação e de quebras de sigilo, com o objetivo de apurar suposta negligência do ministro na contenção dos vândalos.
Ainda no Congresso, ganhou corpo na última semana a insatisfação do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com Dino. Aliados de Lira afirmam que ele ficou profundamente irritado com a operação da PF que mirou aliados seus por suspeitas de corrupção na compra de kits de robótica com dinheiro do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Pior ainda, conforme esses interlocutores do presidente da Câmara, foi a divulgação de informações sobre as investigações nos dias seguintes à ação da PF. Os vazamentos agravaram as desconfianças de Lira de que foi alvo de uma retaliação do governo. No mesmo dia da ação, Flávio Dino se reuniu com Arthur Lira e explicou a ele a dinâmica das operações da PF, negando qualquer vendeta do governo contra o deputado alagoano, que havia “emparedado” o Planalto na votação da medida provisória que formata a gestão Lula. A Operação Hefesto, afinal, foi ordenada pela Justiça Federal em Alagoas. As afirmações do ministro da Justiça de que só ficou sabendo da ação quando ela já estava nas ruas, no entanto, não convenceram Lira. “Não colou”, resume um deputado próximo ao presidente.